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Como Ana Thais Matos superou pobreza para fazer história na Globo



O técnico Tite divulgou, nesta segunda-feira (7), a lista de convocados da seleção brasileira para a Copa do Mundo de 2022, que começa no próximo dia 20. Ao lado do técnico da seleção, na sede da CBF, no Rio, estavam outros seis homens. Entre eles, havia uma única mulher: a jornalista Ana Thais Matos, que também será a única mulher comentarista que a Globo enviará ao Qatar para transmissão do evento da Fifa

Com passagens por veículos tradicionais como "Lance!", "BandSports", "Rádio Globo" e "SporTV", a jornalista se tornou um símbolo de uma nova geração da imprensa esportiva brasileira. Ela nasceu em São Paulo em 1985 na baixada do Glicério, bairro pobre no centro da capital paulista, e se tornou a primeira mulher a comentar um jogo masculino de futebol na Globo, em 2018.

"Minha família tem uma origem bem pobre mesmo. Minha mãe Francisca era empregada doméstica, vendia bandeiras de times no estádio do Pacaembu e cuidava de mim e dos meus cinco irmãos", relatou ao UOL Esporte em 2021.

Aos oito anos, ela e a família se mudaram para Itanhaém, no litoral paulista. "Lá não tinha muita opção: ou você praticava esportes, ou você praticava esportes", contou em outra entrevista, concedida a Universa em 2018.

Ela tentou primeiro outras atividades, como aulas de jazz, teatro e capoeira, mas o que ela de fato gostava era o futebol. "Abriu um campinho no meu bairro e íamos eu e uma amiga jogar futebol na rua. Depois comecei a jogar beach soccer e passei, então, para o futsal. Joguei por mais de dez anos. Quando fui para o futebol de campo, já estava um pouco mais velha, com 16 ou 17 anos", relembra.

Ana Thais tentou ser jogadora quando surgiu a primeira geração das Sereias da Vila, time feminino do Santos, em 2001. "Quando cheguei para treinar, as meninas já tinham uma base formada, já estavam mais à frente. Migrei muito tarde, acabei não conseguindo desenvolver o futebol de campo e não deu certo. Eu desisti.

Hoje jornalista, ela desistiu da carreira esportiva depois da Copa do Mundo de 2002. "A minha família passava por alguns problemas, e eu decidi que precisava reagir, buscar algo diferente. Sempre fui meio inquieta. E aí fui passar um tempo em São Paulo.

Carreira jornalística começou no "Lance!".

Ana Thais prestou, nesta época, vestibular para jornalismo e passou, mas não conseguiu fazer a faculdade porque sua família não tinha como a ajudar financeiramente em uma instituição privada. Então, ela começou a trabalhar em escritórios e foi recepcionista. Com 22 anos, ela tentou novamente prestar vestibular na USP (Universidade de São Paulo): letras na primeira opção e jornalismo, como segunda. A ideia era passar em uma instituição pública para não precisar pagar pelos estudos.

A jovem não passou no vestibular da USP, mas conseguiu uma bolsa de estudos na PUC-SP. "Quando entrei na faculdade, conheci o pessoal que já trabalhava na área. Um amigo me convidou para fazer uma prova de estágio no jornal Lance. Só que o salário era muito pouco, e eu já pagava minhas contas, minha casa. Aí decidi esperar um pouco", conta.

Ela se tornou a única entre os seis filhos de dona Francisca a ter ensino superior. Foi em 2009 que ela começou profissionalmente no jornalismo esportivo no "Lance!".

Em 2018, a jornalista foi convidada para participar do programa "Troca de Passes", do "SporTV", durante a Copa do Mundo. Ela se destacou tanto que foi escalada pelo canal a ficar fixa no programa, como apresentadora. "Me entendi muito bem com os meus companheiros de bancada, todo o mundo valorizava a opinião de todo o mundo. Também é importante trabalhar com pessoas que me tratam como jornalista, não como mulher. Isso é igualdade.

Após o sucesso na apresentação do "Troca", Ana Thais foi convidada para comentar os jogos de futebol e, no ano seguinte, se tornou a primeira mulher a analisar as partidas em transmissões ao vivo da TV Globo.

Machismo na redação e críticas ao Robinho

Ao longo da carreira, Ana Thaís teve que lidar com ataques misóginos. Um dos episódios mais graves aconteceu quando ela teve o número de celular vazado após criticar o anúncio do retorno do jogador Robinho ao Santos, em outubro de 2020. O jogador era acusado na Justiça da Itália de estupro coletivo, cometido em 2013 — ele foi condenado meses depois e, neste ano, teve sentença confirmada pela justiça italiana.

O ataque contra a jornalista prejudicou sua comunicação com o próprio pai, que estava internado na época. "Eu estava indo para São Paulo, foi bem no meio da pandemia e eu tinha deixado meu número de telefone no hospital, um hospital público de difícil comunicação também. Só que vazou meu telefone. Eu não tive outra alternativa e liguei na operadora para trocar meu número.

Ana afirma que nunca esteve em seus planos se tornar um símbolo, mas que agora espera que sua figura ajude a abrir espaço para outras mulheres — já que enfrentar o machismo foi inevitável nas redações esportivas.

"Quando comecei, nós éramos quatro meninas. Terminou o ano e eu era a única. Já vi ali de cara: coisas como apagar matéria, de não publicar matéria, de inventar fofoca, de chegar na hora da rodada, e os meninos ficarem com as coisas mais legais", lembrou na entrevista que deu ao UOL Esporte no ano passado.

"Nunca me deixavam fazer uma crônica do jogo, nunca me deixavam apurar uma notícia. E é curioso isso porque muitos que estavam nessa redação naquele ano, hoje são colegas de trabalho, e eu vejo assim e falo: 'Cara, tu era muito escroto comigo e hoje você é um cara super legal'




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